domingo, 19 de abril de 2009

EU SOU A LUZ DO MUNDO - VÓS SOIS A LUZ DO MUNDO


Em 1985, fui descoberta por um livro - Eu sou a luz do mundo, vós sois a luz do mundo, uma selecção de textos de Huberto Rohden, editado pela Fundação para o Desenvolvimento do Homem Integral.

Huberto Rohden, nasceu em Tubarão, Santa Catarina, Brasil, em 1893 e faleceu em S. Paulo em 1981. Formado em Ciências, Filosofia e Teologia em Universidades Europeias (Áustria, Holanda e Itália. No Brasil trabalhou como professor, conferencista e escritor. Publicou mais de 60 obras sobre ciência, filosofia e religião. Nunca esteve filiado a nenhuma igreja, seita ou partido político. Fundou e dirigiu o movimento mundial «Alvorada», cuja sede é em S. Paulo. Em 1976, esteve em Portugal para fazer conferências sobre auto-conhecimento e auto-realização.

Volvidos todos estes anos (24), reencontrei-me com o livro. Re-li alguns textos. Escolhi dois, boa reflexão:

Se não jejuares em face do mundo, não achareis o Reino;
se não guardares o sábado como sábado, não vereis o Pai.
Frases tão inigmáticas como estas fazem lembrar Lao-Tse no seu Tao. Pela tradição, consta que Tomé esteve na Índia, e na Catedral de S. Tomé, em Madras, existe o seu túmulo.

Que é jejuar em face do mundo?

Que é guardar o sábado como sábado?

Jejuar é abster-se do alimento. Jejuar em face do mundo é abster-se das coisas do mundo. Quem se alimenta das coisas do mundo material sem as transformar é um homem profano, e não um homem espiritual.
Quem não guarda o dia do descanso para dar descanso ao ego e activar o Eu, esse não celebra devidamente o dia do descanso.
Jejuar e descansar não quer dizer necessariamente fugir, abandonar; mas sim libertar-se da tirania do mundo, mesmo vivendo no meio do mundo. O semi-iniciado tem de abbandonar o mundo para não sucumbir ao mundo.
O profano vive no meio dos impuros.
O semi-iniciado vive puro longe dos impuros.
O pleni-iniciado vive puro no meio dos impuros.
O primeiro é como lama.
O segundo é como a água.
O terceiro é como luz.
«Vós sois a luz do mundo».
No princípio, o homem é ego-pensante, ego-vivente, ego-agente - profano.
Depois ele se torna cosmo-pensado, cosmo-vivido, cosmo-agido - o místico.
Por fim o homem se torna cosmo-pensante, cosmo-vivente, cosmo-agente - o homem cósmico, crístico.
Jejuar em face do mundo é viver no meio do mundo profano sem se mundanizar, nem se profanizar.

***

Um homem tinha dois filhos...

A rainha das parábolas de Jesus, chamada, geralmente, a do filho pródigo, não devia ser focalizada num capítulo como este, mas numa obra monumental; porque esta parábola representa um dos mais estupendos documentos do drama multimilenar da evolução do homem rumo a Deus.

O que, em geral, se diz desta parábola, nas igrejas e nos colégios, é apenas o aspecto moral da mesma - mas, por baixo dessa conhecida superfície, se estende a incomensurável profundidade cósmica que só uma intensa intuição espiritual pode atingir em silenciosa vivência.

Quem é esse jovem inexperiente que deseja abandonar a casa paterna?

Quem é esse pai que não tenta dissuadi-lo do seu intento com uma só palavra? E por que não aparece nenhuma mãe a chorar?

Por que o ai não pede ao menos que o jovem aventureiro lhe deixe o endereço do seu paradeiro? Por que, durante a longa ausência, não lhe manda um mensageiro para saber da sua situação?

Nada disto acontece. A parábola do filho pródigo está envolta em mistério e permeada de enigmas. Tudo que a nossa inteligência analítica teria esperado acontecesse não acontece - e nada daquilo que acontece teríamos esperado. É que essa parábola é, mais que qualquer outra, obra de gigante e de génio.

O perfeito paralelo desta parábola se encontra nas primeiras páginas do Génises - Moisés e o Cristo traçam o roteiro eterno da humanidade em evolução, esses dois intérpretes máximos do sub e superconsciente da humanidade. Diz Moisés, no Génises, que o homem do Éden transpôs a fronteira dessa sua vida subconsciente e entrou na zona ego-consciente, graças ao despertar da «serpente» da inteligência. É a história da egoficação luciférica do homem, mais tarde completada por sua cristificação espiritual.

É o drama telúrico-cósmico de Lúcifer e Lógos, a trajectória da inteligência e da razão.

Quando a inteligência desperta no homem, começa ele a afastar-se da «casa paterna», inicia o seu movimento centrífugo, porque sente o despertar da sua personalidade, daautonomia do ego personal, que só se pode desenvolver plenamente no longínquo ateísmo de uma separação consciente de seu centro.

Nesse estágio evolutivo sente o homem a imperiosa necessidade de proclamar em cheio a sua independência, o seu afastamento da escravizante soberania de Deus - falou a «serpente», e o homem lhe escutou a voz sedutora. O homem abandona o Éden da casa paterna, na crescente consciência do seu ego luciférico, e ainda longe do seu Eu crístico.

E começa o grande drama da evolução luciférico-crística, através do qual alguns conquistam o mais alto Everest do Himalaia, ao passo que outros se enamoram das sedutoras esplanadas da montanha ou perecem nos tenebrosos precipícios que a rodeiam...

O «filho mais jovem» do pai reclama a «porção de substância» a que tem direito, diz a Vulgata latina; o texto grego do primeiro século diz que o jovem reclamou «epibállon tés ousías», literalmente: «o que convém à natureza».Que conveniência é essa que o jovem reclama? É aquela parte da sua «ousia» (natureza) que exige evolução longe da casa paterna, isto é, o ego personal, o ego separatista, o Lúcifer, dormente na natureza humana.

E o pai entrega ao filho a porção da sua substância, o elemento, personal para que vá e o desenvolva, segundo as eternas leis da Constituição Cósmica. O pai não protesta, não incrimina, não dissuade o filho, porque sabe que assim deve ser. Também, comom poderia Deus protestar contra as suas próprias leis? Como poderia ele poribir o home de cometer a «félix culpa» e o «peccatum necessarium» (como diz a liturgia da Páscoa) de abandonar o Éden da sua primitividade inconsciência, cair no meio dum campo de «espinhos e de abrolhos» e, por fim, «esmagar a cabeça da serpente rastejante» para ser remido pela «serpente erguida às alturas»?...

E o jovem aventureiro lá se vai, firme e confiante, em demanda de «um país desconhecido» - a zona incógnita da personalidade, da autonomia do ego. Que região sedutora!...

E com isto principia a «vida dissoluta» e o «esbanjamento da substância» que levara da casa paterna. Esbanjar de facto essa substância não o consegue, geralmente, o homem; extinguir totalmente em si o elemento divino, é difícil. Mas o homem, nas vias da evolução personal, se esquece complacentemente da sua verdadeira «ousia» (natureza) divina e se porta como simples personalidade humana, autónomo. O ego humano, porém é formado de corpo e mente. O corpo exige satisfações carnais; a inteligência se identifica com seus pensamentos de orgulho.

Passam-se longos anos no plano dessa evolução físico-mental. O homem atinge o extremo limite das suas satisfações; esbanja tudo - e então lhe sobrevém a grande fome de uma incompreendida insatisfação, não só com o mundo, mas sobretudo consigo mesmo. Mas o homem não sabe ainda com que encher esse vácuo; já sente, e cada vez mais dolorosamente, a insatisfação das coisas, dos sentidos e do intelectuo, mas não encontrou ainda o objecto de uma verdadeira satisfação e felicidade.

Então tentou o jovem aventureiro em terra estranha conquistar a felicidade agarrando-se -o texto grego diz «aglutinando-se», a Vulgata diz: «aderindo» - a um cidadão daquela terra flagelada por terrível carestia. Como um náufrago se agarra a uma prancha em pleno mar, assim se agarrou esse náufrago do ego à primeira tábua semipodre que pôde apanhar. Esse cidadão a que o filho pródigo se agarrou era habitante antigo nessa terra, algum invetebrado egoísta, que já não tinha a possibilidade de sentir a sua infelicidade, e era por isto horrorosamente feliz em sua matéria...

Mas esse velho cidadão satisfeito consigo mesmo, graças a sua obtusidade espiritual, não pôde transferir a sua infeliz satisfação para o infeliz insatisfeito que a ele se agarra; neste grande naufrágio, esse jovem não estava ainda suficientemente fossilizado no seu egoísmo para não sentir a sua profunda infelicidade. O velho egoísta satisfeito manda o jovem egoísta insatisfeito para a sua granja, com a ordem de lhe guadar os porcos. Mas as vagens indigestas que os porcos comiam não eram alimento para a fome do jovem. Por algum tempo, sentado no meio da imunda manada, andou ele invejando o crepitante apetite com que os suínos mastigavam o seu grosseiro repasto - e veio-lhe o desejo de pelo menos «encher a barriga» - implere ventrem suum, como diz cruamente o texto - já que não podia matar a fome com as vagens que davam pelna satisfação aos irracionais. Talvez os porcos não fossem felizes, cismava o jovem, mas ao menos não eram infelizes como ele. Tenta então camuflar com ilusões temporárias a sua infelicidade e narcotizar artificialmente uma voz interna que não lhe dava sossego. Mas não havia quem lhe desse essas vagens dos irracionais. Ele, o ser humano, não poddia involver, regredir ao plano dos seres inconscientes e gozar da infeliz felicidade que eles gozavam...
E essa possibilidade de inovação animalesca foi para o jovem o maior dos benefícios. Descer abaixo do nível do ego não lhe era possível; ficar nesse nível era-lhe insuportável tortura - resolveu então ultrapassar o seu próprio plano e evolver em vez de involver ou estagnar...
Seria de esperar que aquele cidadão que o contratara lhe desse pelo menos como passadio as vagens que os porcos comiam, mas, diz o Mestre admiravelmente, que tal não aconteceu. Nem podia acontecer! Ninguém dá o que não tem. Como podia aquele velho egoísta, auto-complacente e satisfeito consigo, dar satisfação ao jovem egoísta, insatisfeito com o que era?...
E foi nesse transe doloroso, humilhante e angustiante, que aconteceu o mais glorioso dos prodígios: o jovem pastor de suínos «entrou em si mesmo». Depois do egresso da casa paterna, faz o ingresso para dentro de seu próprio Eu, preparando o regresso para a sua definitiva redenção. Entre o egresso e o regresso está invariavelmente esse misterioso ingresso, esse «caminho estreito», essa «porta apertada», esse «fundo de agulha»; quem conseguir passar os desfiladeiro está salvo.
«Entrou em si mesmo», pela primeira vez na vida, porque até essa data tinha ele estado fora de si, andando num círculo vicioso ao redor de si, pela periferia do ego físico-mental. Depois de tantas evasões centrífugas, o jovem iniciando realiza, finalmente a feliz invasão centrípeda; ultrapassa o ego humano e encontra-se com o seu Eu divino!...
E terminou o ocaso em plena alvorada!...
E logo despontou na sua alma a verdade sobre si mesmo. Desanuviaram-se os horizontes... Dissiparam-se as trevas ... Houve um grande «fiat lux»...
E fez-se luz... O jovem viu claramente que ele não era escravo daquele tirano que o mandara guardar os porcos, nem era pastor de animais imundos; viu que isto não passava de funções temporárias e fictícias da sua humana personalidade, mas era a verdadeira natureza da sua divina individualidade, do seu ser real... Verificou, com exultante surpresa, que ainda não esbanjara totalmente o «quinhão da sua natureza», era ainda filho daquele pai que abandonara; a centelha divina, que tanto tempo dormia sob as cinzas, acabava de romper em vívida chama, ao sopro da tempestade...
Conheceu a verdade sobre si mesmo - e a verdade o libertou...
Terminado o período egressivo do seu ego luciférico - começa o período regressivo do seu Ego crístico...
E a luz da verdade foi seguida de perto pela força da realidade prática.
Levantou-se, deixou os porcos e seu velho tirano - e foi em demanda de seu pai. Este lhe corre ao encontro; por sinal que esperava o filho e tinha a certeza de seu regresso. Abraça-o, beija-o, manda vestir-lhe a preciosa túnica, põe-lhe no dedo um anel e calçado nos pés - e segue-se grande solenidade, com banquete, música e bailados, isto é, todas as manifestações de alegria e júbilo pela plena realização de um homem.
Nisto chega do campo o filho mais velho e, sabendo que se tratava, recusa-se a tomar parte nos festejos. Tenta o pai persuadi-lo da conveniência da solenidade, mas o filho continua inflexível: nada compreende do lado positivo do acontecimento; enxerga apenas o aspecto negativo e lembra que ele, há tantos anos, serve o pai em perfeita obediência, e este nunca lhe dera um cabrito para ele celebrar um banquete com seus amigos.
O pai lhe fala no «irmão» dele; o despeitado, porém, só lhe chama «teu filho». E não tem ele razão? Jã não existe afinidade entre os dois, entre o profano e o iniciado, entre o homem que espera recompensa por ser bom e aquele que é bom por amor.
Não basta cumprir os mandamentos do Pai, não basta evitar o mal, e praticar o bem - tudo isto é necessário, mas não é suficiente para a plena realização do Eu - é necessário ser bom, que é incomparavelmente mais do que fazer o bem. Fazer o bem é do plano moral, indispensável como preliminar; é ainda a ética pré-mística sacrificial mercenária, que espera ser recompensada - o iniciado, porém que é intimamente bom, não espera nada disto - ama simplesmente e é feliz nesse amor.
E assim termina o Mestre a mais profunda das suas parábolas - a parábola sobre a auto-realização ou cristificação do homem, que percorreu todos os estágios da sua evolução e culminou no homem integral.

2 comentários:

Maria Souza disse...

Amiga de Luz!
" Eu sou a luz do mundo-Vós sois a luz do mundo", é uma frase que o seu sentido é de uma profundidade incrivel.
Mas gostei de ler o artigo todo e confesso que aprendi muita coisa com ele.
Obrigada, amiga!
Muita Luz e paz
Maria Souza

Maria Souza disse...

Não podia me ir embora sem deixar o meu comentário.
Vai em frente, amiga, não desistas dos teus sonhos, luta por eles para eles se realizarem.
Pensamento ao alto e tudo vai bem.
Luz e Paz no teu coração.
Maria Souza